quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

O dia mais feliz da minha vida - 2a parte

Depois que o médico chegou, a coisa ficou mais real. As dores já não eram lá muito suportáveis e eu tive que deitar na maca para ir ao centro-cirúrgico, o que agravou ainda mais as malditas. Lembro que me levaram para a sala de parto humanizado, que era aonde havia vaga. Na sala havia uma grande janela pintada imitando uma paisagem. Estava extremamente frio por lá e eu batia o queixo de nervoso, frio e dor. O Pedro demorou uma eternidade para aparecer vestido de médico. O médico, então fez o exame de toque e surpreendemente ficou animado com o que viu. A bolsa já havia rompido, eu estava com 3,5 cm de dilatação e a Isabel já não estava tão alta. “Dá pra tentar por baixo”, disse, e eu nunca vou esquecer dessas palavras e de como eu fiquei feliz naquele momento. Colocou um soro com ocitocina e em poucos minutos o que já estava hard de agüentar ficou absolutamente insuportável. Cheguei a me arrepender de ter desejado passar por tudo aquilo. Mas era também a hora do anestesista entrar em ação. Assim que a anestesia pegou as coisas melhoraram um pouco. Mas logo depois as contrações foram ficando tão violentas que eu nem parecia mais estar anestesiada. Nessa hora eu só pensava na minha avó que teve 9 PNs, sem anestesia, sendo um deles em casa. Pensava nas índias, parindo no meio do mato e também nas mulheres que tem seus filhos pelos SUS sem direito a anestesia e em como aquilo era mais cruel! Foi sem dúvida a dor mais forte que já havia sentido, e o médico me confirmava que era assim mesmo, que algumas mulheres batem com a cabeça na parede nos hospitais públicos. Nessa hora eu nem lembrava mais da minha filha, só queria que aquilo acabasse logo. A dilatação progredia bastante e chegou a 8cm. Mas a neném, que chegou a descer um pouco, de repente empacou. Lá pelas 3 da manhã os médicos (que eram pai e filho) acharam que não valia mais a pena continuar, pois algo estava provavelmente impedindo o encaixe, talvez o osso do meu quadril, disseram. O fato é que tentar mais, não era indicado. Nessa hora senti minha bola baixar um pouco. Embora fosse o momento que sempre sonhei, como já havia sentido tanta dor até ali, fiquei triste de ter que entrar na faca e depois sentir todo o desconforto de um pós-operatório. Mas tentei me animar pensando que o que mais importava ainda estava para acontecer. Só queria parar de sentir dor, pois agora elas não eram mais bem-vindas. Me deram uma dose maior de peridural e logo não sentia mais dor alguma. Essa hora foi maravilhosa, pois eu sentia tudo da cintura para baixo exceto a dor. Depois que tudo começou foi bem rápido, mas eu estava meio que drogada por conta da anestesia, e acho que por conta de algum sedativo também, não sei. Lembro que tinha dificuldade de focalizar as coisas e via tudo em dobro. Sentia inveja do Pedro e da sua posição privilegiada para acompanhar tudo aquilo, ali calmamente filmando e fotografando. Nunca vou esquecer a hora em que ela nasceu: a pressão das mãos na minha barriga, o alívio quando senti ela descolar de dentro de mim, o chorinho dela e a primeira visão que tive daquele serzinho vermelho e cabeludo, todo amassadinho. Lembro que eu perguntava para o Pedro com quem ela se parecia, pois eu não conseguia ter noção da sua fisionomia naquela posição. Colocaram ela em cima de mim mas eu me sentia tão incapaz de ampará-la e protegê-la com aqueles braços presos à mesa. Pedi para tirarem logo, pois tinha medo de ela cair lá de cima. Lembro da inveja ainda maior que tive do Pedro saindo daquela sala com aquele prêmio nas mãos, indo mostrar para as dezenas de pessoas que, mesmo às 3:42 da manhã esperavam lá no berçário. Só pedi para ele voltar para me dizer o peso e a medida e me dar notícias das pessoas. Fiquei lá mais uma infinidade (para mim) de tempo para ser costurada. Fiquei acordada até o Pedro voltar dizendo o tamanho (inacreditáveis) 52cm e o peso, 3615 g da pequena e antes do fim da cirurgia apaguei (o anestesista havia colocado um sedativo para isso). Depois disso, fiquei esperando no corredor e a Neves e Lali apareceram para me socorrer me acompanhar até o quarto. A partir daí, as lembranças já são meio confusas, cheia de sentimentos ambíguos. Eu estava exausta e meio adormecida, sonhando com o TP, com as dores, com a bolsa rompendo e com tudo aquilo que eu tinha vivido e com tudo o que eu não tinha vivido também. Tinha um sentimento estranho de falta, de que aquilo tudo não havia se completado. Engraçado é que nessa hora eu não conseguia pensar no daqui para frente, mas só no que eu havia passado, na intensidade de tudo aquilo, e na calmaria que eu vivia agora - naquele momento eu sentia como se não houvesse mais nada de grandioso para acontecer, como se o grande acontecido já tivesse passado, sei lá.
Disseram que ela só subiria às 6:00, mas lá pelas cinco eu escutei um choro forte no corredor. Acordei e disse pro Pedro, que tentava descansar, que era Isabel chegando. Ele duvidou pois ainda faltava uma hora para a hora marcada. Mas eu reconheci na hora aquele choro forte e inconfundível que ela tem até hoje. Ela entrou no quarto e logo a puseram para mamar. Eu ainda não estava liberada para elevar a cabeceira e por isso não conseguia olhá-la direto, como eu tanto havia imaginado. Também não conseguia acomodá-la naquela posição, mas por sorte a bichinha pegou o peito bem rápido. Lembro do Pedro fazendo a primeira troca de fraldas, e reclamando da dificuldade de tirar a roupinha que eu tinha escolhido para aquele momento. Eu estava nervosa, como medo de ele não acertar segurá-la e de ela ficar com algum trauma, veja só. Depois fiquei com ela no meu peito e acho que adormecemos um pouco assim, mas eu acordava a todo momento com as imagens do parto na cabeça. Às 6:00 algumas pessoas começaram a chegar, achando que estava me internando naquela hora. O chato é que eu não podia falar, contar tudo, como eu gostaria. A chegada das pessoas me deixou eufórica e excitada novamente, precisando falar sobre aquilo tudo, mas eu não podia. Essa parte é talvez uma das partes mais chatas na cesárea. Você quer viver esses momentos intensamente mas está cheia de dor e de restrições.



A partir daí já não lembro de tantos detalhes, só sei que me sentia meio anestesiada, como se a minha ficha ainda não tivesse caído. Não me sentia ainda capaz de cuidar da Isabel sozinha e lembro de me sentir muito fragilizada nesse pós-operatório, precisando muito de ajuda para tudo, cheia de dúvidas. Só um pouco mais tarde fui me apaixonando pelo papel de mãe e me sentindo realmente dona da situação.

Hoje minha pequena é um serzinho com idéias próprias e uma super companheira, mas volta e meia ainda me lembro da sua chegada, daquele bebezinho dificil de decifrar como são todos os recém nascidos das mães de primeira viagem. Já com o segundo a história foi um pouco diferente, mas isso fica para um outro dia...

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